O rádio inseparável tagarelando coisas em AM, trilha de fundo para Penhoca dizer nos meus ouvidos de menina de quando ela era copeira no Rio de Janeiro, veja bem: co-pei-ra! Que tinha aprendido a servir como manda o figurino nas festas e jantares finos, nos almoços triviais. Que até uniforme usava, a preta Penhoca com o olho mais jabuticaba do mundo a me transportar para a casa de pratarias, toalhas de linho e segredos de família guardados em cristaleiras. Quando baixava nela o santo, ou quando atendia telefonema de gente mais importante que ligava lá em casa, ela tirava da cartola um vestígio de carioquês e ia embora na conversa sem rumo.
De corpo forte e aprumado zanzando pela vida afora, fazia um balé brejeiro na cozinha de nossa casa, minha única casa-casa, casa de pé no chão de Vila Rica, matogrossense cidadinha na esquina ali com o Pará. Interrompia o pás-de-deux solitário pra correr no portão quando o leiteiro gritava, todo santo dia. Saía ela com o caneco em punho, estendia o braço e via a vasilha encher daquele leite mileumavezes derramado fogão abaixo. Porque Penhoca não era mulher de ficar vigiando leite ferver. Muito menos era mulher de cuidar de lambança de bicho, “que eu não sou babá de gato”, repetia, desfiando o "tédio" que sentia pela sujeira aprontada por nossa bichana Tuquinha.
Um brinde ao tédio que Penhoca nunca deixava acontecer em volta dela, à sua risada escancarada, seus bolinhos-de-chuva encharcados de açúcar e canela, seu gosto pela fofoca sem danos, sua doce deselegância, suas dancinhas sedutoras, seu Zezé di Camargo e Luciano, seu Leonardo, seu feijão feito na hora, sua lealdade, um brinde à sua trabalheira com os filhos, ao olé que deu no marido apurrinhado, ao batom e ao perfume, à sua casa em eterna construção, ao seu medo de fantasma, à sua sina no centro-oeste escaldante, à saudade que ela deixa agora, Penhoca: Maria da Penha, cheia de graça.
De corpo forte e aprumado zanzando pela vida afora, fazia um balé brejeiro na cozinha de nossa casa, minha única casa-casa, casa de pé no chão de Vila Rica, matogrossense cidadinha na esquina ali com o Pará. Interrompia o pás-de-deux solitário pra correr no portão quando o leiteiro gritava, todo santo dia. Saía ela com o caneco em punho, estendia o braço e via a vasilha encher daquele leite mileumavezes derramado fogão abaixo. Porque Penhoca não era mulher de ficar vigiando leite ferver. Muito menos era mulher de cuidar de lambança de bicho, “que eu não sou babá de gato”, repetia, desfiando o "tédio" que sentia pela sujeira aprontada por nossa bichana Tuquinha.
Um brinde ao tédio que Penhoca nunca deixava acontecer em volta dela, à sua risada escancarada, seus bolinhos-de-chuva encharcados de açúcar e canela, seu gosto pela fofoca sem danos, sua doce deselegância, suas dancinhas sedutoras, seu Zezé di Camargo e Luciano, seu Leonardo, seu feijão feito na hora, sua lealdade, um brinde à sua trabalheira com os filhos, ao olé que deu no marido apurrinhado, ao batom e ao perfume, à sua casa em eterna construção, ao seu medo de fantasma, à sua sina no centro-oeste escaldante, à saudade que ela deixa agora, Penhoca: Maria da Penha, cheia de graça.
7 comentários:
maria, vim te visitar e lembrei do esqueleto da sua luzia. está por aqui também?
:-)
tá sim, elisa. dá uma busca no search blog no alto, à esquerda, vale? beju
mama
quer conhecer essa seu santiago demais
Eu tenho um "Pas de Deux sem lugar" que combina com o de Penhoca, solitário http://maisoumenandonadismos.blogspot.com/2006/11/um-pra-l-e-um-pra-c.html
Eu tenho tara por caneca de esmalte, fofoca, canela, e essas coisas pequenas que tão importantes ficam em mãos de Maria, da Penha ou da Bahia, sempre cheia de graça.
Adorei, maria.
vontade de renascer e viver tudo novamente. lembrei-me da minha ZAZAI: mae, vó, tia e escrava ao mesmo tempo.
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