(...) Acontece em abril, nessa curva do mês que descamba para a segunda metade. Os boletins meteorológicos não se lembraram de anunciá-lo em linguagem especial. Nenhuma autoridade, munida de organismo publicitário, tirou partido do acontecimento. Discretos, silenciosos, chegaram os dias lindos.
E aboliram, sem providências drásticas, o estatuto do calor. A temperatura ficou amena, conduzindo à revisão do vestuário. Protege-se um tudo-nada do corpo, que vivia por aí exposto e suado, bufando contra os excessos da natureza. E, sob esse mínimo de agasalho, a pele contente recebe a visita dos dias lindos.
A cor. Redescobrimos o azul correto, o azul azul, que há meses se despedaçara em manchas cinzentas no branco sujo do espaço. O azul reconstituiu-se na luz filtrada, decantada, que lava também os matizes empobrecidos das coisas naturais e das fabricadas. A cor é mais cor, na pureza deste ar que ousa desafiar os vapores, emanações e fuligens da era tecnológica. E o raio de sol benevolente, pousando no objeto, tem alguma coisa de carícia.
(...) Então, é preciso fazer justiça aos dias lindos, oferecer-lhes nossa gratidão. Será egoísmo curti-los na moita, deixando de comentar com os amigos e até com desconhecidos que por acaso ainda não perceberam o raro presente de abril: “Veja como o dia está lindo”. Não precisa botar ênfase na exclamação. Pode até fazê-la baixinho, como quem transmite um boato e não deseja comprometer-se com a segurança nacional. Mesmo assim, a afirmação pega. Não só o dia fica mais lindo, como também o ouvinte, quem sabe se distraído ou de lenta percepção sensorial, ganha a chance de descobri-lo igualmente. Descobre e passa adiante a informação. (...)
Pode ser que o desconhecido lhe responda com um palavrão, desses em moda na sociedade. Não faz mal. Não se ofenda. Ele descarregou sobre a sua observação amical o azedume que começava a corroê-lo no íntimo. Livre desse fel, talvez se habilite a olhar também para o céu e a descobrir mesmo certa beleza esvoaçante no urubu. De qualquer modo, foi avisado. Já sabe o que estava perdendo: a consciência de que certos dias de abril e maio são mais lindos do que os outros dias em geral, e nos integram num conjunto harmonioso, em que somos ao mesmo tempo ar, luz, suavidade e gente.
* foto-presente de Paula Huven, em cartaz na piscina-galeria

2 comentários:
maricota meu abril tava meio fechado e talvez por isso esqueci de dar bom dia pelo seu dia justo no dia certo o meu tambem ja passou e hoje ja é quase fim do mes mas faltou voce no top bar depois utopia comigo e com a erika pela primeira vez depois de muito tempo até tivemos um aniversario legal espero que vc tambem. viva as arianas desmioladas!!! beijocas e frou frou :)
Maria, que bonito. E ainda tem gente que acha que o abril é despedaçado. Qual o problema de existiram folhas secas ao chão? Sem abril outono não existiria setembro primavera.
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