domingo, dezembro 14, 2003

"Amizade é matéria de salvação"
(Clarice L.)


Aurora
(Rimbaud)

Abracei a aurora de verão.
Nada se movia ainda na fachada dos palácios.
A água estava morta.
Os campos de sombras não deixavam o caminho do bosque.
Andei, acordando os hálitos ví­vidos e tépidos,
e as pedras preciosas olharam,
e as asas se levantaram sem barulho.

O primeiro empreendimento
foi num atalho cheio de brilhos novos
e pálidos.
Uma flor que me disse o nome.

Sorri à  loura cascata que descia desgrenhada através dos
pinheiros:
No cimo prateado, reconheci a deusa.

Então levantei os véus,
um a um.
Na alameda, agitando os braços pela planí­cie a fora,
onde a denunciei ao galo.
Na grande cidade,
ela fugia entre os campanários e cúpulas
e correndo como um mendigo sobre os cais de mármore, eu a perseguia.

No alto da estrada,
perto de um bosque de louros
eu a envolvi com seus véus amontoados,
e senti um pouco seu imenso corpo.
A aurora e a criança tombaram na orla do bosque.

Quando acordei,
era meio-dia.

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